Impactos da pandemia na saúde mental das crianças e jovens

Impactos da pandemia na saúde mental das crianças e jovens

Isolamento, aulas online, distância dos amigos, espaços pequenos e muita, muita tela. A fórmula da pandemia vai longe em relação às novas rotinas das crianças e jovens, que desde março do ano passado estão ficando muito mais tempo dentro de casa, distanciados do convívio social.

A preocupação com a saúde mental, antes vista como secundária, passou a ser algo fundamental, pois os sintomas começaram a aparecer, seja nos adultos ou nos mais jovens. Há de se ter muito cuidado em relação à psicologia infanto-juvenil, pois os impactos dos transtornos e traumas surgidos na infância e na adolescência tendem a acompanhar o adulto por toda a sua vida.

Deve-se, ainda, ter atenção redobrada no caso de crianças e jovens socialmente mais vulneráveis. Infelizmente, nossa sociedade ainda está longe do ideal em relação aos cuidados com este público, tanto nas questões relacionadas à gestão da pandemia quanto em seus desdobramentos psicológicos.

Os adultos têm um papel primordial nas consequências do isolamento em casa para seus filhos. Pais devem dar o exemplo ao controlar o estresse no ambiente e dialogar com as crianças e jovens, tirando dúvidas quando possível e acalmando os ânimos. Quando o adulto não sabe como lidar com a situação, é necessário se informar ou contar com um profissional.

Para colaborar com a elucidação a respeito do tema, trazemos os principais pontos a se ter atenção em relação à saúde mental de crianças e jovens dentro do contexto de enfrentamento da Covid-19:

Telas e seus impactos

O aumento da exposição de crianças e jovens às telas não foi ainda mensurado de maneira definitiva em estudos. Porém, há a análise de que há uma grande elevação e que isto é prejudicial à saúde física e mental. Quanto mais tempo de uso de telas, mais impactos no sono, humor, atenção, concentração e, consequentemente, no aprendizado dos pequenos. Além dos efeitos nos olhos, cérebro e no corpo todo. Mesmo dentro de casa, é necessário estipular limites para as telas e explorar com eles alternativas para o lazer.

Alimentação, sedentarismo e obesidade

A alimentação caseira poderia ser um benefício para as crianças e jovens que têm o hábito de comer fora muitas vezes na semana. Estima-se que a refeição em casa é menos gordurosa e industrializada. Porém, com pais sobrecarregados e desacostumados com a cozinha, fica difícil colocar na rotina a preparação dos alimentos. O fastfood pedido por delivery (basicamente pizza e sanduíche) e as guloseimas industrializadas consumidas simplesmente por “não ter mais nada para fazer” ou por ansiedade são os grandes vilões.

A má alimentação aliada ao sedentarismo reforçado pelo isolamento social só poderia resultar no aumento dos índices de obesidade tanto em crianças e jovens quanto em adultos. Em um país como o nosso, no qual 1 em cada 5 pessoas estão com sobrepeso ou obesas (dados do Ministério da Saúde em 2018), o cenário futuro pode ser bem grave.

Na outra ponta, há as crianças em vulnerabilidade social, que são prejudicadas pela insegurança alimentar. O quadro piora com a recessão econômica, uma vez que mais famílias perdem poder econômico, e com o distanciamento escolar, já que é na escola que muitas crianças fazem suas refeições.

Ansiedade e fobias

O medo da doença por parte de familiares afeta negativamente as crianças. Muitas vezes o cuidado é confundido com pavor. A criança absorve toda a ansiedade e fobias dos adultos e tende a amedrontar-se com o que está acontecendo. Quando a família assiste ao noticiário e as imagens são chocantes, as crianças ficam assustadas, mesmo que não falem abertamente. O efeito pode ser o desenvolvimento de comportamento compulsivo, fobias e outros transtornos.

Além disso, sintomas de ansiedade, depressão e outros transtornos são a consequência de um combo que pouco contribui para a saúde mental: pouca interação social, telas em excesso, alimentação não balanceada, falta de atividade física, pouca exposição ao ambiente externo, medo e mudanças bruscas de rotina. Sem contar a incerteza em relação ao futuro.

Desenvolvimento social

Crianças e jovens precisam da vida social para aprender a lidar com o outro e consigo mesmo. A falta de convivência com pessoas que não são da família pode atrasar seu desenvolvimento em diversos aspectos. O ambiente escolar é rico em aprendizado social, uma vez que a criança se depara com diversidade comportamental e cultural. A casa de amigos ou primos também oferece novos estímulos para o repertório da criança e do jovem. Quando a pessoa permanece em sua própria casa, ela perde todo este contato com outras maneiras de se comportar, brincar, aprender e viver.

Desenvolvimento intelectual

Alguns especialistas defendem que o ensino remoto é insuficiente em relação ao processo de aprendizagem de crianças e que esta lacuna pode ser maior ou menor dependendo da faixa etária, porém ela existe em qualquer caso. Os impactos das telas e a questão do desenvolvimento social já citados interferem diretamente na qualidade pedagógica. A falta de interação social prejudica as experiências das crianças, que, muitas vezes, aprendem mais com o lúdico e com a observação.

Relacionamento familiar

Estudo chinês (fonte: Nexo Jornal) demonstra a dependência exagerada dos pais como o principal impacto na saúde mental de crianças e jovens. Quem é mãe ou pai sabe como o filho ou filha se comporta diferente quando está longe de seu olhar. Aos cuidados dos pais, as crianças tendem a pedir ajuda para tudo. Quando estão longe, precisam aprender a realizar pequenas tarefas sozinhas. Já os jovens tendem a ter preguiça de realizar atividades de autocuidado e até mesmo de higiene pessoal. O resultado é a cobrança por parte dos pais, que ficam estressados. Pais sobrecarregados, por sua vez, não conseguir gerir de maneira saudável as relações dentro de casa.

O retorno: quais a consequências para a saúde mental da criança e jovem?

O retorno às aulas e à vida social, que vem sendo desenhado pelas autoridades em diversos países, é uma incógnita. Há especialistas que defendem o retorno imediato, para melhorar os quadros já descritos. Outros alertam para o perigo de novas ondas de contaminação com o retorno do convívio escolar e outras atividades. Temos visto exemplos de outros países, mais bem-sucedidos que o Brasil ou não.

O que se pode afirmar até o momento como medidas importantes para a hora do retorno:

  • As famílias devem dialogar com as crianças e jovens, buscando entender o seu ponto de vista a respeito de tudo o que está acontecendo: entender se eles têm medos, dúvidas ou anseios;
  • Crianças e jovens devem ser orientados em relação à importância das medidas de segurança e higiene;
  • Atividades não obrigatórias presencialmente devem ser avaliadas pela família;
  • A criança ou jovem exposto à interação social na escola não deve ter contato próximo com pessoas do grupo de risco, se possível. Este distanciamento provisório deve ser tema de diálogo na família, para que todos possam entender a importância.

Tão logo a vacinação contra Covid-19 passe a ocorrer de modo planejado e consistente, a tendência da sociedade é reduzir os cuidados. Porém, é preciso ter paciência e cautela.

Converse com sua família e estabeleça limites e diretrizes, para que todos possam passar por esta nova fase da pandemia em segurança.

Barbara Valsezia